Crônicas Guajaramirenses - O Estatuto que contém avanços é o mesmo que criou constrangimentos

Por Paulo Saldanha
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O Mamoré
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   *Por Paulo Saldanha
       
 A Constituição Brasileira no artigo 227, também assegura a proteção integral à criança e ao adolescente: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."
            Desculpem-me pelo atrevimento, mas vou transitar por outra seara, invocando Rui Barbosa: “Há tantos burros mandando em homens de inteligência, que, às vezes, fico pensando que a burrice é uma ciência”. E vou tentar me justificar, valendo-me do Estatuto da Criança e do Adolescente, instrumento sancionado por Fernando Collor, acolitado pelos Ministros Bernardo Cabral, Carlos Chiarelli, Antônio Magri e Margarida Procópio, personalidades reconhecidas como inteligentes e de notável saber, tanto que chegaram à cúpula do poder. Por outro lado, nem isso é vantagem, porque outros sabidamente ignorantes, espertos e medíocres também montaram estruturas eivadas de vícios daqueles mais intoleráveis, lá no Planalto.
            Todavia, se desejo reconhecer o avanço que esse Estatuto trouxe para as novas gerações em termos de conquistas e proteção, de certa forma o mesmo também trouxe atraso, pois acabou surrupiando do adolescente o direito ao trabalho, este como ordenador de conduta edificadora e que permitia adquirir aprendizado, disciplina, respeito à hierarquia e sua valorização pessoal como elemento garantidor de dignidade humana, até porque sempre terá que ser remunerado.
            E não me venham sociólogos e/ou os psicólogos arautos de uma falsa moralidade com as horrendas chorumelas de sempre... “A criança e o adolescente têm os mesmos direitos que uma pessoa adulta e, além disso, têm alguns direitos especiais, por estarem em desenvolvimento físico, psicológico, moral e social.” E eu pergunto: por que não ter direito ao trabalho diário de, ao menos, 4 horas? Isso poderia se dar sem prejuízo do compromisso de estudar e evoluir, ao tempo em que desenvolveriam suas aptidões e com a descoberta dos seus talentos através do trabalho bem orientado. Interagiriam com pessoas, conheceriam os trâmites da compra e venda, entenderiam o planejamento e a visão de futuro, seus direitos e suas obrigações, o comando e a hierarquia, as relações públicas e humanas, a socialização, as amizades e as diferenças.
            Através de supervisão competente (há normativos) o jovem poderia ter assegurado o direito a estágios! Tudo bem. E para o jovem ansioso por idêntica valorização, mas que não tem acesso ao estágio? Como esse cidadão pode ficar?
            Como esse jovem tem sonhos, aspirações, desejos de consumo (muitas vezes, tão pequenos) e expectativas, esse pequeno ser fica marginalizado porque existe uma lei absurda que o proíbe de trabalhar e ainda pune o empreendedor que o empregar, ao oferecer-lhe uma ocupação ainda que por apenas 4 horas diárias, sem privá-lo do necessário horário escolar.
            E então, ante a falta de opções, centenas e centenas de adolescentes são abraçados pelo tráfico de drogas (que o emprega sem pedir currículo), pela marginalidade que corrompe os valores morais, mas lhe dá ganhos estratosféricos, porque o Estado, por uma lei cerceadora, lhe veda a chance de ter ganhos financeiros pelo bom caminho, talvez por miopia dos governantes, talvez por burrice desses, abrindo aos jovens uma porteira para a contravenção e para o crime. Uma trajetória muitas vezes sem volta... Que pena! Afinal, a teoria é uma, a prática é bem outra...
            E o pior é que a lógica do garoto é bem forte:
“-Moço, eu tinha um emprego; obrigaram o patrão a me demitir, ele, que tão bem me acolhia; ameaçaram ele de prisão e o puniram severamente. Naquele tempo eu ainda estudava... fui para outro emprego, acontecendo o mesmo, aí, seu moço, saí da escola, vim vender droga. Me pagam bem e o Governo não me atrapalha... E estou ganhando um bom dinheiro. Já tenho meu tênis, um bom celular, vou ao shopping ver os filmes e como sanduíche do Bob’s. O Governo só atrapalhava a minha vida quando eu estudava e tinha um trabalho honesto... Agora, não!”
            Ao jovem “estragado” por uma legislação equivocada, para matar, traficar e roubar não há empecilhos, haja vista a falência do sistema de segurança. Trabalhar, ganhando seus honestos rendimentos e estudar, não pode...
            Que futuro esplendoroso uma lei burra assegura aos jovens do nosso país!...
            Vamos, deputados e senadores honestos! Façam projetos de lei que realmente protejam as crianças e os adolescentes que ainda não foram vítimas desse tresloucado Estatuto, esse ECA maluco, como malucos foram aqueles que o conceberam com essa dissonância !

* PAULO CORDEIRO SALDANHA: Nasceu em 1946, em Guajará–Mirim, Rondônia. É Advogado e hoteleiro. Foi Presidente de Bancos Estaduais de Rondônia e Roraima, Diretor do Banco da Amazônia e Diretor–Geral do Tribunal Regional do Trabalho da 14º Região. Cronista e Romancista. É Membro Fundador da Academia Guajaramirense de Letras-AGL e Membro Efetivo da Academia de Letras de Rondônia-ACLER. 
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