Acometido há meses de uma doença, Martinzão como também é carinhosamente chamado, deixará saudades a familiares, amigos e colegas de trabalho no Exército Brasileiro.
Seu corpo está sendo velado na Igreja Santo Antônio, no bairro Próspero.
Quem foi Martinzão
O
Cabo do Exército Francisco Martins do Nascimento, da reserva remunerada
da instituição militar à qual serviu por trinta anos, distinguido no
dia 24 de agosto com a Medalha do Pacificador, teve uma
trajetória de vida muito digna de um herói. De família humilde de Porto
Velho, ele chegou ao Forte do Príncipe da Beira na segunda metade da
década de 1960, mais precisamente em 1967, levado por uma empresa de
construção civil que estava construindo uma vila militar naquele local.
Era pedreiro, tinha pouco mais de 18 anos de idade, tinha uma esposa e
três filhos, fato que indica que casou muito precocemente, que tinha
vocação para pai de família.
No
entanto, a despeito das responsabilidades com a família, ele era um
jovem como os outros, gostava de dançar iê-Iê-iê e outras músicas da Jovem Guarda
que reinava na época. E jogava futebol, jogava muito bem, fato que
contribuiu para a sua fácil adaptação com os outros jovens do local que
também praticavam muitos esportes naquela época. Das famosas peladas
vespertinas do Forte do Príncipe, realizadas diariamente entre as cinco
da tarde até o cair da noite, veio-lhe o apelido pelo qual ele foi
conhecido durante muitos anos: Leão. Tal apelido, que
lhe foi posto pelo Cabo Erasmo, que não jogava nada de futebol mas
treinava muito bem as equipes juvenis, nada teve a ver com o seu porte
atarracado, mas sim com a basta cabeleira que cultivava na época,
totalmente diferente dos jovens locais, que usavam invariavelmente o
corte de cabelo no estilo militar. A longa cabeleira do Martins fez dele
o Leão como é conhecido até hoje pelos seus
contemporâneos daquela época. Anos mais tarde, já vivendo em
Guajará-Mirim, ele ganhou novo apelido, passando a ser conhecido como Martinzão.
Como
se fosse uma predestinação, quando ele embarcou no Catalina em 1968,
embora já houvesse recebido na incorporação ao Exército o nome de guerra
de Martins, ele era de fato conhecido por Leão,
e foi mesmo como um leão de verdade que ele se comportou na selva
durante os três dias que duraram as buscas ao avião desaparecido nas
selvas a poucos minutos de voo do aeroporto de Guajará-Mirim. E foi por
esses atos de legítima bravura que ele foi agora distinguido, quarenta e
quatro anos depois do acidente aviatório, com a honrosa Medalha do
Pacificador, a mais alta comenda conferida pelo Exército. A longa espera
não decorreu de ato de negligência ou ingratidão do Exército, mas sim
de fortuito erro administrativo. Acontece que na época do acidente
Francisco Martins era recruta do Exército incorporado há pouco tempo,
não tinha direito a nenhuma licença, mas precisava ver a sua mãe enferma
em Porto Velho. Solicitada a licença ao Comandante do Pelotão, Tenente
Joari do Nascimento Barreto, este, com base no RDE, negou-lhe a
permissão para a viagem. No entanto, a namorada do Comandante, Terezinha
Paraguassu, que estava no Forte do Príncipe a passeio e também viajaria
para Porto Velho no mesmo voo, ponderou com o Comandante para que
concedesse a licença ao recruta. Não querendo desagradar à namorada, o
Tenente Joari concordou em dar uma licença informal ao Soldado,
estabelecendo, porém, que ele viajaria como civil, em trajes civis, que
foi como de fato ele tomou o avião. A farda de Soldado que ele queria
mostrar à mãe em Porto Velho foi guardada na mala.
O
Comandante Joari também viajou no avião. Quando aconteceu o acidente,
Martins prestou socorro a vários feridos e ficou logo com a roupa muito
suja de sangue. Então, ele apresentou-se ao seu Comandante e solicitou
formalmente para trocar a roupa suja pela farda que conduzia na mala,
voltando a ser oficialmente um Soldado. O resto da história já é
conhecido e nem precisamos rememorar aqui, pois o fato já foi bastante
divulgado. Portanto, para os jovens que não conhecem bem a história,
fica esclarecido aqui por que o Cabo Francisco Martins do Nascimento
mereceu a Medalha do Pacificador e somente a recebeu depois de mais de quatro décadas.
Fonte: O MAMORÉ/Prof. Matias Mendes