Coluna Almanaque: PEDRAS NO CAMINHO

Por Fábio Marques
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O Mamoré
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Por Fábio Marques
Por mais que tentasse, o poeta nunca conseguiu se conformar com o método de vida que a elite burguesa buscava lhe empurrar goela-abaixo e que tinha como modelo o cada um por si e que foda-se o restante. No parco entender deste intelectual de boteco, o modelo imposto pregava que para se ter status e conforto material era preciso trabalhar. E para trabalhar era preciso obedecer. E para obedecer, o que era preciso fazer? Ora! Para obedecer era preciso ser tapado em algumas coisas. E para ser tapado em algumas coisas, era preciso ir às igrejas aos domingos, assistir às novelas ou aos netflixs da TV por assinatura, torcer para Flamengos ou Corinthians, frequentar pagodes, forrobodós ou pagar ingressos para shows de Wesleys Safadões, etc...
Em depressão quase que suicida, achava que sobrevivia numa sociedade doente onde a vontade de alguns era imposta através da censura na base do “empurra” para a maioria idiotizada e que, por conseqüência, matava os intelectuais através da loucura ou da exposição ao ridículo. Aquela história de “Em terra de sapo, de cócoras com ele” se aplicava “ipsis-literis” ao modelo de sociedade em que estava vivendo. Pelo manual deste modus-operandi, sem comércio, dinheiro e trabalho não haveria como alcançar o bem-estar, porque para estes escrotos com sérios problemas cerebrais, não ter um bom emprego seria a mesma coisa que estar fudido; e ver-se excluído do mercado de trabalho, seria como perder a própria honradez.
De vez em quando chegavam aos ouvidos do poeta notícias de que um ou outro servidor público que até ganhavam bem em seus serviços, mas que tinham o mau hábito de engordar suas contas bancárias às custas de achaques, recibos de propinas e corrupção pura e simples no exercício de suas funções, que lhe davam vontade de vomitar. Nestas horas lembrava de seu saudoso pai, um homem rude mas muito decente, ex-sargento do exército e depois armador de pesca, mas que nunca deveu um tostão para filho da puta nenhum. Limitou-se a dizer: “Homem que é homem não mente e nem rouba”. Educou seus três filhos com esta filosofia, e estes três filhos nunca deveram um tostão à ninguém, e se deveram, pagaram.
Outra coisa que também lhe retorcia os nervos era quando estava na companhia de chegados nas mesas de conversas e algum ou outro amigo resolvia lhe cutucar que dada a situação da economia, a coisa mais fácil do mundo nos dias de hoje era adquirir uma Mitsubishi zerada no plano Leasing, bastando para isso que o poeta pagasse apenas cinco mil reais todos os meses para passar a viver como um bacana de verdade. Pra vocês verem: estes eram seus amigos seres humanos com os quais convivia.
Em seus delírios, o poeta achava que a única forma de se construir uma sociedade mais justa e fraternal em direitos e deveres, seria através da revolta popular. Como um cara de vanguarda da antiga esquerda, queria apenas liberdade e igualdade para os cidadãos da roça, da cidade, do mundo, do universo. Se todo esse povo tivesse emprego, moradia, saúde, educação e lazer; e que estes direitos fossem bancados pelo Estado, este louco sonhador não iria estar nem aí se alguns sebosos torrassem seu dinheiro com Mercedes-Benz, Chivas Regal, champanhe e caviar.

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